sábado, 21 de fevereiro de 2015

Close To The Edge, ou A Arte De Administrar Perdas

Houve um tempo em que eu acreditava ser possível construir sonhos. Eu não os enxergava como nuvens efêmeras surgidas nas madrugadas e que nos impeliria a querer transformá-los em realidades. Eu pensava algo oposto; eu acreditava que, a partir de fragmentos do real (palpável) poderíamos, com nosso puro esforço e dedicação, à luz do dia, construir sonhos reais em nossa consciência e no mundo. Os sonhos eram, para mim, como uma potência latente, pela qual cumpriríamos nossos desejos no mundo real.

Eu sentia essa potência em mim. Eu sabia que um caminho somente seria tangível se houvesse a transformação de uma possibilidade (das muitas existentes), por essa força que eu chamava sonho, em ordenação ativa da realidade. Eu pensava assim. Eu agia assim. Vencer obstáculos, sem necessariamente ter que destruí-los. Ao contrário, vencer implicaria (o quanto de ingênuo eu era?) mais acolher que destruir. Pelos sonhos, compondo a urdidura da vida, eu me sentia capaz de tecer o meu próprio destino.

Hoje sei que eu estava errado! Não basta a vontade, não basta a potência. E como não existe (definitivamente!) essa “coisa” de destino, tudo na vida não passa de um jogo entre o acaso, as imperfeições e as instabilidades. E nesse jogo eu não tive sorte...

(E depois dos Temporais... 15/05/2004)

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Eu tinha acabado de entrar na faculdade de filosofia. Início dos anos 70, a “barra” pesando horrores. Havia medo, era nítido, as pessoas demoravam a confiar umas nas outras. Comigo, entretanto, até hoje não sei bem o porquê, a sensação que eu vivia (e que me dominava) era de liberdade. Eu sentia firmeza no que queria, inclusive para minha vida pessoal, mesmo sabendo de todas as imensas dificuldades que teria de enfrentar. Tudo era hostil: o ambiente político tolhendo o pensamento, os preconceitos em relação à homossexualidade em proporções exponencialmente maiores do que hoje, a incerteza que pairava sobre o futuro. E, apesar disso, mesmo hoje quando recordo de tudo, a primeira ideia que me vem à mente é a tal sensação de liberdade. Eu vivia a minha liberdade e tinha certeza que, mais alguns poucos anos, ela seria plena.




Close to the Edge foi o meu primeiro contato com o Yes. Eu estava na casa de um primo e a capa verde daquele disco, de uma banda que eu nunca tinha ouvido falar, me chamou a atenção. E foi colocar na vitrola... se eu fosse resumir todo o parágrafo anterior, nada melhor do que essa música. Quantas vezes depois a ouvi?

Eu tinha, eu sempre tive tanta certeza, que um dia eu teria alguém, que iria me acompanhar todos os dias da minha vida, não como em um sonho, mas na realidade deslumbrante de um amor possível, tão concreto, tão ao meu alcance, que eu conseguia até imaginar seu sorriso, toda vez em que, com ou sem palavras, disséssemos que nos amávamos.


2 comentários:

  1. Sua esperança ficou cativa no passado. A sua potencia não tem nada com isso, muito menos seus sonhos.....
    Já parou para pensar que talvez o problema tenha sido a FALTA de potência e sonhos dos outros?
    Não deveríamos nos sentir culpados por sermos mais fortes, ter mais sonhos, ter mais do que os outros....
    bjs

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