domingo, 13 de julho de 2014

Razão e Emoção

Ontem revi Gênio Indomável (Good Will Hunting - 1997) filme de Gus Van Sant. A trama gira em torno de Will Hunting, gênio autodidata, com habilidades excepcionais em matemática e em ciências físico-químicas, mas que trabalha como servente numa universidade, além de fazer bicos como pedreiro. Carregando sérios problemas da sua infância, ele vive envolvido, com seus amigos mais próximos, em brigas e bebedeiras, até que um dia tem seu talento descoberto ao resolver um complicadíssimo problema de matemática (na verdade um desafio) deixado num mural para os alunos da universidade.

O núcleo dramático do filme é constituído, além do jovem Will, pelo professor de matemática (que se torna o responsável jurídico por ele, detido por reiteradas brigas de rua) e pelo psicólogo que irá acompanhar o seu caso (um amigo do professor, dos tempos de faculdade e que demonstra ser uma pessoa sofrida com seu passado). Além da surpresa (ao menos pra mim... rs) pelo roteiro original, muito bem desenvolvido por Matt Damon (Will) e Ben Affleck (Chuckie, um dos amigos mais próximos de Will), não se pode dizer que o filme seja uma obra de arte. Na verdade, os pontos altos do filme são justamente os diálogos que ocorrem entre os personagens e que giram, quase sempre, em torno do tema “razão x emoção”.

Nessa revisão que fiz agora do filme, me veio à mente uma frase que, ao que consta (rs), costuma ser o “mote”, dito por uma analista a um amigo: você vai muito bem... do pescoço pra cima! Entendo perfeitamente isso, pois vivo assim ultimamente. Esse amigo costuma dizer que, ao menos, eu já tive experiências emocionais na minha vida. Certo, já tive. Penso, entretanto, que para a riqueza emocional da vida, pouco importa essas experiências passadas, na medida em que o único sentido delas é o vivê-las no momento de sua construção. Enquanto passado, nosso acesso a elas, inevitavelmente, passa pelo crivo da razão.

Quanto dessa emoção, que um dia existiu, agora acessada no presente, cede lugar para a estruturação da lógica do saber? Ou, perguntando de outra forma: quanto do sabor se perde no saber? Divagando... rs.    

Uma cena significativa: um dos primeiros encontros entre Will e Sean (Robin Willians, o psicólogo). Serve como metáfora para um diálogo entre o saber, que se fundamenta na razão, a as vivências, possíveis apenas pela emoção que a vida real nos proporciona.


12 comentários:

  1. Então... a emoção, tal qual um perfume, aos poucos vai se perdendo no tempo, corroída justamente pela razão. O tempo, o distanciamento acaba por favorecer à Razão nessa brincadeira... Mas a experiência está lá, guardadinha... e em algum momento, durante toda a análise "racional"... vai ter aquele segundo em que você vai se lembrar da sensação de ter sentido o cheiro da Capela Sistina pela primeira vez.. e é isso que importa! Do contrário, seria apenas uma história de livro... ;-)

    Eu vi esse filme por indicação de um amigo, muito bacana as questões que ele levanta... e principalmente "as conversas" que ocorrem.... para ser o filme da minha vida, faltou apenas se passar em uma cafeteria! ehehehe

    E que bordoada essa conversa, né?! Abração!

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  2. fiquei com vontade de assistir, já vou colocar na minha lista aqui ;)

    dentrodabolh.blogspot.com

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  3. Off-topic: seus/meus problemas acabaram! https://www.youtube.com/watch?v=0IiWD-WFQWA

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  4. q coisa ... não assisti ... na lista de prioridades ... com certeza ...

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  5. Existirá a memória dessa emoção que pode ser evocada pelo viés racional. A escrita é uma dessas formas racionais para evocar uma emoção, assim como todas as formas de expressão artística. Concordo com você.... ainda assim não é a emoção em si, mas a memória dela.
    Acredito que a razão não "rouba" o encantamento da emoção.
    Tudo dependerá da natureza da memória que se tem.
    A memória nascida de um sentimento doloroso pode ser atenuada pela razão... Pode até ser quase "apagada" pela razão ( o que dá essa sensação de que a razão "rouba" o encantamento das emoções ).
    A memória nascida de um sentimento de segurança e acolhimento necessita muito pouco da razão para ser evocada....Ela se faz reconhecida nos olhos e situações amistosas genuínas.
    Muitas vezes nossa memória das emoções está carregada de ambivalências.....Segurança e abandono...Amor e morte....Completude e vazio....
    Memórias que se chocam constantemente em conflito....A lembrança daquilo que foi doce e a lembrança daquilo que tornou-se amargo...
    Talvez......somente talvez..... o tamanho da memória que prevalece é aquela que mais precisa da razão como amortecedor dessa dor.....
    Divagações.....
    bjs

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    1. Vamos lá (rs)... acho que você sabe, mas não custa escrever: emoção, ou um ato emocional (seja de prazer, ou de dor), exige encontro. Exige relação, exige presença... exige um eu/você, sem intermediações. Após esse “acontecimento”, que configura o ato emocional, o que resta? A memória, pelo que sei, faz parte do aparato racional. Mas, relevemos... depois do acontecimento, a relação/presença se desfaz. Mesmo que na história exista uma continuidade (favorável, ou não), aquele particular ato nunca mais irá se repetir. Quando, então, resolvemos aplicar um discurso (seja em qualquer formato) sobre esse ato, a originária relação eu/você transmuta-se numa relação eu/isso, como resultado da intervenção (inexorável... rs) da razão do eu. Resumo: no way, my friend! (rs) Emoção/sentimento é prerrogativa da vida do agora!

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    2. Concordo com tudo que você escreveu, porém....rsrs
      Acredito que toda relação , seja ela eu/você ou eu/isso, implica em uma troca.
      No eu/você a troca se dá de maneira menos racional, mas não está desprovida totalmente da razão! É nela que se pode ver o surgimento do amor, visto que o meu sentimento entremeia-se com o sentimento do outro de forma dinâmica e viva. No mundo "psi" chamamos de relação interpessoal.
      No eu/isso a troca se dá de maneira menos emocional, mas não está desprovida totalmente de emoção. É nela que se pode ver o surgimento da fé, crenças pessoais nascidas da vivência na relação ( boa ou não ) eu/ você. No mundo "psi" chamamos de relação intrapsíquica!
      Ambas relações são interdependentes!
      O eu/ você não pode ser entendido sem a relação eu/isso e vice versa.
      Sinto o que sinto porque penso ou pensei sobre meu sentimento.
      Penso o que penso porque sinto ou senti sobre meu pensamento.
      Tenho fé no amor porque amo ter fé.
      Ainda que concorde com você que as emoções são primárias à razão, é pela razão que nos mantemos abertos ou fechados às emoções!
      Bjs

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    3. Ah, sim, tudo na vida é encadeamento, fluxo. Não existe uma relação eu/você (que é bem menos frequente) independente das relações eu/isso (que ocupam o maior espaço em nossas vidas). O que eu quero (e insisto em... rs) dizer é que, numa real, verdadeira, completa, abrangente e profunda relação eu/você não existe interferência da instância racional. Aliás, se existir, ela passa a não ser real, verdadeira, etc. Os momentos se sucedem, emaranhados... em geral muito da relação eu/você acaba, posteriormente, por se transformar numa relação eu/isso. É inevitável. Mas, nada impede, também, que uma relação eu/isso possa vir a se transformar numa relação eu/você. Resumo: acho que concordamos, apesar dos discursos aparentemente diferentes! (rs)

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    4. Uma coisa que pensei agora: o meu discurso tende a ser fotográfico (analítico), enquanto o seu tende ao cinematográfico (sintético). Será? rs

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    5. Acertou em cheio! Eu trocaria o cinematográfico por operístico....rsrs.
      Na época da ópera eu não conseguia subir em um palco se não tivesse esclarecido o que o meu personagem estava cantando, porque ele cantava daquela forma e principalmente qual era a relação dele com os demais personagens.
      Paradoxalmente, apesar de toda essa "racionalização".....quando as cortinas se abriam era uma relação eu/você que acontecia....emoção em estado puro.
      bjs

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    6. “... quando as cortinas se abriam...” é exatamente disso que eu falo quando me refiro a uma relação eu/você! É o domínio da emoção, é outra esfera mental, onde nada existe fora daquele momento... é o êxtase! E que existe apenas enquanto presença, sem intermediação alguma. Você pode pensar antes, racionalizar, pode (e, no seu caso, deve) envolver técnicas sofisticadas. Mas, basta que as cortinas se abram...

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    7. e aí vem a pergunta fatídica: quem nasceu primeiro....ou ambos nasceram juntos?

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